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sábado, 13 de junho de 2020

Perdido e achado pelo santo lisboeta

Da minha infância não trago tantas memórias. Já disse isso aqui em outra ocasião. Talvez por não ter tido uma infância atípica, cheia de aventuras, viagens e peraltices. Mas se a vida fosse um armário, certamente minha infância contaria com uma gaveta especial com recortes de Santo Antônio.
Minha avó é devota de Santo Antônio há mais de quatro décadas. No alto de seus 77 anos, não lembra mais o porquê de se tornar devota do santo, mas pondera: "não foi por marido, nunca pedi marido pra ele". A verdade é que ela diz ter lido a história dele e ter se encantado com seus milagres, desde então escolheu Santo Antônio por protetor. 
A partir desta devoção, eu cresci em casa (sempre morando com a minha avó de quem herdei essa religiosidade toda) assistindo ano após ano o dia 13 de junho ser esperado com fidelidade e devoção. Todos os anos era sagrado ela fazer a trezena e acender a vela ao lado de uma imagem do santo frade. E não bastasse isso, para não resumir a devoção às quatro paredes de casa, todos estes anos minha avó distribui centenas de pães, os famosos 'pãezinhos de Santo Antônio'. Ano passado (2019), foram mais de 400! Neste ano, devido as restrições sanitárias de participação nas celebrações, encomendamos só 300 pães e distribuiremos na Igreja de Santo Antônio de Lisboa na Batista Campos, para alguma outra comunidade e para familiares e amigos de nossa família.

Os reencontros - Como disse, se a vida fosse um armário, Santo Antônio teria um espaço reservado nele. Ainda que eu não tenha criado devoção por ele, aprendi com os anos a admirá-lo muito mais. Quando entrei para o Seminário Maior da Arquidiocese de Belém, em 2014, pude reencontrar alguém tão devoto deste "santo milagreiro". O reitor de nosso Seminário, Cônego Vladian, levava a sério a devoção e, com isso, envolvia toda nossa comunidade formativa nos festejos do santo na Capela do Pão de Santo Antônio, no bairro do Guamá. Esta capela, por muitas vezes foi visitada por mim quando acompanhava a vovó na distribuição do pão. Mas mesmo morando fora de casa e vivendo de novo e de outro jeito esta devoção, não me tornei seu devoto. Mas aprendi a valorizá-lo ainda mais. Se a vovó soube me trazer o carinho por Santo Antônio pela história de sua vida que ela me contava diversas vezes, no Seminário aumentei esse carinho contemplando a sua obra, o seu pensamento. De fato, lá tive mais contato com alguns de seus textos e detalhes de sua mente teológica.
Em 2014, na Trezena do Santo na Capela do Pão de Santo Antônio, em Belém. Na foto seguro um relicário com um fragmento do osso do santo lisboeta.

No início deste ano, tive a oportunidade de estar em Lisboa por 5 dias. Fui pra Portugal sem sequer lembrar que Santo Antônio nasceu em Lisboa (até hoje não me perdoo por esta falha com o santo). Na minha cabeça, Portugal se resumia à Fátima (devoção da minha mãe). 
É bem interessante que Santo Antônio é invocado, entre muitas coisas, como o santo que ajuda a achar as coisas perdidas. "Recupera-se o perdido", diz o seu responso que aprendi menino. Pois bem, muito encantado que eu estava por ter saído do Brasil e estar no continente europeu, decidi livremente passear pelas ruas de Lisboa na noite, a primeira noite que eu estava por lá. Saí do hotel, jantei ali na esquina e depois ganhei o mundo, ou melhor: ganhei Lisboa. 
A caminhar pelas atraentes ruas do bairro da Alfama, às margens do Rio Tejo, decidi ir à Missa na Sé de Lisboa. Queria conhecer. Por ser minha primeira noite na cidade e estar sozinho, penso que mexi no celular e digitei apressadamente pela Igreja para ver onde estava a Sé. Assim, observei e decorei o caminho, botei o celular no bolso e me pus a "bater perna". 
Lá pelas tantas, nunca esqueço, entrei numa ladeira não tão íngreme. Parecia um túnel. Mas estava no meu roteiro, então a subi. Conforme fui subindo, fui me vendo do lado de uma Igreja esplêndida, de arquitetura barroca e pombalina. E, óbvio, fui lá conferir. Já na porta, vi Santo Antônio numa estátua. A ficha começou a cair conforme fui dando passos e adentrando ao templo. Lá dentro, caiu a a ficha e caiu também uma lágrima. Eu estava na Basílica de Santo Antônio de Lisboa, construída sobre a casa onde ele nasceu. Que graça!
Fachada da Igreja Basílica de Santo Antônio, na Alfama, em Lisboa. Foto: Leonardo Monteiro.

A igreja que temos hoje não é mais a original do Século XII. Um terremoto que abalou Lisboa a destruiu, só ficou intacta a imagem que até hoje é conservada no altar-mor. A cripta da igreja, porém, também ficou intacta. E é lá que quero chegar agora. 
Não conseguiria descrever a emoção que foi para mim, que ainda estava impactado de estar no lugar onde ele nasceu, ao mesmo tempo que estava irado comigo de não ter incluído na minha lista de passeio aquela Igreja. Graças a Deus, Santo Antônio não acha só objetos perdidos, acha também as pessoas perdidas, vulgo: eu mesmo!!!
Para ter acesso à cripta é necessário passar pela sacristia imponente, com azulejos belíssimos, móveis de madeiras que respiram o ar de antiguidade. Há ainda na Sacristia, em anexo, uma lojinha com Santo Antônio para todos os gostos, cores, tamanhos e larguras. 
Saindo da Sacristia dei de cara com uma porta: "Quarto de Santo Antônio". Estava fechado, também, já era uma hora avançada da noite. Os santos também têm privacidade, viu?! Ali só fiz minha oração na porta mesmo.
Quarto de Santo Antônio. Foto: Leonardo Monteiro. 
Em seguida há uma escada estreita e curva. Fui descendo sozinho e sem ninguém me acompanhando. Descobrindo cada canto daquele lugar. E aí cheguei na cela onde Santo Antônio nasceu. Uma cela apertadíssima, pequena demais, com um altar ao santo, uma grande e um genuflexório para os fiéis. Ali não é lugar de conversa, por isso não há cadeiras. Também não cabe muita gente ao mesmo tempo. É um lugar que convida à oração, ao recolhimento, à simplicidade. Fiz minha oração ali, ajoelhado, e mais lágrimas me vieram recordando que o santo lisboeta sempre esteve comigo, na minha família, na minha vida, e pedi desculpas a ele, claro, por ter esquecido dele no meu plano de viagem. Acho que ele me desculpou.
Escada que dá acesso ao local de nascimento de Santo Antônio. Foto: Leonardo Monteiro.

Corredor paralelo à Sacristia, onde ficam os banheiros públicos da Igreja. Foto: Leonardo Monteiro.
Cela onde nasceu Santo Antônio. Foto: Secretariado Nacional de Cultura (Portugal)
Saindo daquele lugar, me senti renovado. E tive a certeza que Santo Antônio quis me receber na cidade onde ele nasceu. Foi uma experiência única! Acabei desistindo de ir à Sé naquele dia, a hora estava avançada e queria retornar para ter um descanso merecido após as mais de 20 horas de viagem. Dias depois, novamente sem saber, tomei o caminho de Santo Antônio novamente. Estava andando mesmo pra (re)conhecer aquele bairro charmoso, e me descobri de novo aos pés da igreja do santo. Ali mesmo, de fora, rezei, e continuei a andança. 
Imagem de Santo Antônio que sobreviveu ao terremoto.

Interior da Igreja
Cúpula da Igreja

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Minha experiência com o "Embaixador do Papa"

Nesta segunda-feira (1º/06), tão logo iniciado o mês de junho também a Igreja no Brasil recebeu uma importante comunicação da Santa Sé. Trata-se da transferência de dom Giovanni D'Aniello, até então Núncio Apostólico do Brasil, para a diplomacia vaticana na Rússia.
Conheci dom Giovanni em 2012. O Papa Bento XVI tinha instituído neste período o chamado "Ano da Fé" e eu estava como repórter do Jornal "Voz de Nazaré", em Belém. O diplomata tinha sido nomeado por Bento XVI para a Nunciatura Apostólica no Brasil em fevereiro deste mesmo ano. Poucos meses depois soubemos na capital paraense que ele estaria no Círio de Nazaré.
Desta feita, ocorreu o primeiro contato com ele. Por ocasião do Círio, dom Giovanni presidiu a Missa de início da Trasladação no dia 13 de outubro. Foi uma Missa (eu lembro bem) muito marcante. A música escrita pelo Pe. Fábio de Melo e dada à Fafá de Belém tinha acabado de ser lançada. Por isso, ao final da Missa, "Eu sou de lá" foi cantada diante do Núncio pela própria Fafá que, ousadamente, puxou o Arcebispo Metropolitano de Belém, dom Alberto Taveira Corrêa, para cantar junto com ela. Até hoje, em meus arquivos, eu tenho este vídeo. Mas, se ficou curioso com este momento, você pode conferir aqui.
Logo após este ato histórico, a procissão saiu e dom Giovanni ficou no Colégio Gentil Bittencourt. Tinha decidido ver somente a passagem da berlinda no Edifício Manoel Pinto. E assim o fez. Mas, antes que saísse, eu me aproximei e solicitei a entrevista prontamente concedida. Aliás, sempre o achei muito simpático no tratamento com a imprensa.
Em uma entrevista de pouco mais de dois minutos, ele falou sobre o Ano da Fé e as primeiras impressões da procissão mariana que acabara de conhecer. Confira abaixo a transcrição e o áudio (em baixa qualidade) da entrevista.
Em 2012, na entrevista concedida a mim para o Jornal Voz de Nazaré, logo após a saída Trasladação, no Colégio Gentil Bittencourt, em Belém-PA


Depois disso, tive pontuais contatos com dom D'Aniello. Não consigo lembrar com exatidão. Mas no ano seguinte, novamente no Círio, tive oportunidade novamente cumprimentá-lo. Depois foram outros rápidos contatos.
Em novembro do ano passado o Papa Francisco decidiu reestruturar a organização eclesiástica do Regional Norte 2 (Pará e Amapá): elevou a então Diocese de Santarém à Arquidiocese, transferindo o auxiliar de Belém, dom Irineu Roman para primeiro Arcebispo Metropolitano de Santarém; elevou à Prelazia do Xingu à Diocese de Xingu-Altamira, mantendo Dom João Muniz como Bispo Diocesano; e, por fim, criou a tão sonhada Prelazia do Alto-Xingu Tucumã, colocando o agostiniano dom Frei Jesús María Mauléon, como prelado. Bom, nem precisa dizer que com tudo isso, era super importante e sinal de prestígio a presença do Excelentíssimo Revdmº Núncio Apostólico no Brasil, dom Giovanni D'Aniello. Desta vez eu estava como assessor de comunicação da CNBB Norte 2, aí lembro bem os detalhes de infraestrutura e logística que tivemos que nos preocupar. Nunca vou esquecer este momento onde eu, na minha insignificância, pude estar nos bastidores de um ato histórico para a Igreja no Pará. Única celebração que eu me ausentei foi a do Alto-Xingu. Talvez isso mereça outra crônica porque foram muitas experiências (inclusive a de andar num jatinho pela primeira vez).
Começando as articulações, coube a mim ser o assessor de imprensa dos bispos que viessem e, claro, do Núncio Apostólico. Foi bem legal a experiência, embora eu tenha ficado muito nervoso de estabelecer com ele a comunicação necessária entre assessor e assessorado. Mas estando em Altamira, logo conversamos e acertamos os detalhes: ele preferia falar sempre ao final das celebrações, não via muito sentido falar antes do ato realizado, atenderia as demandas relacionadas somente com os eventos (achei super prudente essa ponderação dele, do jeito que estamos tão polarizados, uma fala fora de lugar pode gerar um mau estar geral).
E assim foram por 3 dias de convívio. Sempre muito humilde, espontâneo e brincalhão, conversava e perguntava sobre tudo o que não conhecia da região. Claro que, sempre, aos bispos, seus irmãos. Vez ou outra a mim ou a outra pessoa que estivesse por perto.
Com dom Giovanni em Santarém, logo após ter dado a posse ao novo arcebispo da Pérola do Tapajós
Cena digna de memória foi no táxi-aéreo que pegamos de Altamira para Santarém (por extrema necessidade depois de um voo ter sido cancelado). Era eu e mais 8 bispos numa aeronave pequena para nossos costumes. Obviamente, deixei todos os bispos entrarem primeiro e escolherem seus lugares. Ocorre que eu não tinha dimensão de como era lá dentro. Eles foram entrando e foram sentado logo nas primeiras poltronas que passavam, daí, naquele super-ultra-mega espremido corredor eu tive que passar com muita dificuldade, pelo pouco espaço e pela mínima altura. Eu, praticamente, engatinhei para chegar na primeira poltrona que era a única vazia a me esperar. Com caridade, dom Giovanni me ajudou, se esquivou na cadeira e depois colocou a mão na minha costa para não esquecer que o teto era baixo.
Mais adiante, após a decolagem, todos estavam num digno repouso. Eu também. Mas, com exceção de dom Jesús Mauléon - que pela primeira vez na vida estava no Pará, o Núncio era o único que ia atento contemplando nossas matas e rios com aquela visão privilegiada. Eu lembro que ofereci água para ele por, no mínimo, três vezes, e ele sempre sorria e dizia que não. Na última vez que ofereci, ele sorrindo, mostrou-me que tinha uma garrafinha com ele e estava cheia (por que logo na primeira vez ele não mostrou isso? rs).
No apertado avião saindo de Altamira para Santarém. Dom Giovani aparece de batina branca, no fundo da aeronave.



Bom, foi uma experiência super agradável. E acho que foi a maior autoridade eclesiástica da Igreja que eu já assessorei, hehehe. Isso é inesquecível por si. Em uma rede social eu postei a foto abaixo e escrevi: "não é todo dia que se assessora o embaixador do Papa".
Hoje, percebendo a transferência, desejo a dom Giovanni muito êxito nesta nova missão que ele assume. Certamente será árdua, haja vista o histórico da Rússia. Porém, com a experiência que ele tem certamente poderá contribuir e muito...


SEGUE A ENTREVISTA feita em 13/10/2012: